sábado, 23 de março de 2013

Homenagem a Luís do Espírito Santo, Leitor de Leonardo Coimbra



                 
                    

Luís Tavares, «Homenagem a Luís do Espírito Santo, Leitor de Leonardo Coimbra», in revista Nova Águia, nº11, 1º semestre, 2013, pp. 98-99, Zéfiro.


                                                

Fui amigo do Professor Luís do Espírito Santo. Pertenceu ao grupo da Filosofia Portuguesa, tendo sido discípulo de Álvaro Ribeiro e de José Marinho, discípulos de Leonardo Coimbra.
Luís do Espírito Santo foi leitor atento e grande admirador da obra de Leonardo Coimbra. Conviveu com muitos outros pensadores daquele movimento como pode atestar a fotografia publicada no nº 8 da Revista Nova Águia, bem como um livro seu  incluindo cartas enviadas a António Quadros, Jorge Preto, Agostinho da Silva, Orlando Vitorino entre outros, tais como os primeiros acima citados (Vivências, Ésquilo, 1998).
Deixo aqui a minha breve e modesta mas atenciosa homenagem a Luís do Espírito Santo que conheci quando encetava uma nova fase de publicações e estudos mais aprofundados após alguns interregnos por força das circunstâncias da sua vida. Antes, nas décadas de 50 e 60, havia publicado em revistas da especialidade juntamente com alguns elementos do grupo da Filosofia Portuguesa. Entre traduções (Platão, República, Guimarães Editora, etc.) publicou o livro Filosofia e Política (Rev. Gil Vicente, Guimarães).
Nesta nova e última fase foram publicados três livros (O Amor em Debate - posfácio de Pinharanda Gomes, 1998 -, Vivências (1998) e Estudos Comparativos: Henri Bergson – Leonardo Coimbra , todos na Editora Ésquilo), dos quais pude acompanhar a feitura quando nos encontrávamos e conversávamos nos cafés (aos Anjos, em Lisboa). Estes precediam um livro de maior fôlego com cerca de quinhentas páginas sobre várias temáticas, entre as quais os Templários e o Convento de Cristo em Tomar. Mas infelizmente o seu falecimento impediu a sua publicação, uma vez que alguns dos manuscritos parecem ter sido votados ao esquecimento.
Seguem-se algumas citações do seu livro sobre Henri Bergson e Leonardo Coimbra ( dedicado ao “Mestre Álvaro Ribeiro e ao Amigo António Quadros”), dando testemunho da sua grande admiração pelo filósofo e pensador português, juntando leituras e reflexões suas, fragmentos do próprio Leonardo Coimbra e umas referências por Manuel Barbosa da Costa Freitas:
“O Filósofo do “Criacionismo”, e autor da “Alegria, A Dor e a Graça”, do “Diálogo do Amor e da Morte”, em seu permanente sopro de humanismo, empenhava-se sobretudo em espiritualizar o homem, em o levar a cumprir o seu destino transcendente, em o arrancar do egoísmo, da inércia, do cepticismo suicida, para o projectar no mundo das luzes imarcescíveis, nas rotas da sua plena realização social e metafísica, sem o que a vida não vale a pena ser vivida.
Assim criou um mundo. Um mundo maior do que o Mundo” (p.43).
“Num livro muito interessante, “As religiões da Lusitânia”, de Leite de Vasconcelos, podemos verificar que as crenças de natureza mitraica, bem como o espírito panteísta, e ainda certas crenças e práticas dos “cátaros”, o Evangelho de S. João e o “Marcianismo”, impregnaram toda a natureza do pensamento religioso português.”
“Os templos portugueses são concebidos de tal modo que quem neles permaneça, medite e reze sentir-se-á como se ali fosse o centro do Universo. Gravados sobre as colunas e nos próprios muros, estão os símbolos da natureza animal, vegetal e mineral que parecem participar activamente da vida universal que o templo simboliza, e, conterem mensagens do passado que cumpre decifrar. O ser humano, ali, é possuído por uma profunda quietude de alma. Pensamos mesmo que deve ter sido num templo português que Leonardo conheceu a presença individual de Deus, quando, durante a infância, acompanhava ao Domingo, os seus familiares à Igreja. Talvez mesmo, durante a vida, o nosso filósofo ali acorresse para melhor e mais sossegadamente pensar o plano das suas obras.
Em Portugal o templo é um lugar onde, em recolhimento, como que sentimos a presença e a assistência de Deus. Ali, o nosso pensamento, encontra o bom caminho.
As meditações de Leonardo devem ter sido tão calorosas como foram os seus discursos, a todo o instante nos seus escritos encontramos beleza, calor e bondade” (pp. 52 e 53).
“Leonardo, no Criacionismo, afirma […] “o pensamento é portanto criacionista não porque crie a realidade, mas porque a sua adaptação à vida social é obra da sua liberdade efectiva, isto é, da sua acção solidária. E assim é uma permanente criação.”
“M.B. da Costa Freitas, na pág. 6 do livro “O Pensamento Filosófico de Leonardo Coimbra”, diz que o Criacionismo “afirma resultar do conhecimento duma actividade racional que elabora intuições, garantindo assim o espírito” (p.62).
“Leonardo afirma “quando apreendo uma flor será ela criação da minha sensibilidade ou entendimento?...”
“Não existirá em si uma actividade genésica que a flor actualiza?...”
“Existe e não sou eu que a crio tomando dela conhecimento; a minha consciência é que revive as relações que constituem essa realidade e tal é a qualidade do criacionismo do nosso pensamento. Não acrescentamos, fazendo-nos convivas; comunicamos e sobre o primeiro movimento da comunicação erguemos toda a vontade de mais e penetrante convivência” “(p.62).

(Obra citada: Luís do Espírito Santo, Estudos Comparativos: Henri Bergson – Leonardo Coimbra, Lisboa, Ésquilo, 1999.)

Luís Tavares (18/12/2012)




Foto: Luís do Espírito Santo e Luís de Barreiros Tavares (1999-2000 +-).

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