domingo, 29 de janeiro de 2017

Sophia de Mello Breyner Andresen - um poema

De todos os cantos do mundo

Amo com um amor mais forte e mais profundo

Aquela praia extasiada e nua

Onde me uni ao mar, ao vento e à lua

-

“De Poesia” (1940), in Antologia, Porto, Figueirinhas, 5ª ed., 1985.

Foi transcrito do livro

E quando é copiar-colar é a partir de uma transcrição que fizemos de um nosso blogue “antigo”.






Continuação António Lobo Antunes “O Manual dos Inquisidores”… excerto II - o que se segue ao anterior excerto I

Continuação António Lobo Antunes “O Manual dos Inquisidores”… 

vide a postagem anterior sobre a obra

“[…] as minhas irmãs e as minhas primas passadas, a contratarem à pressa um advogado que impedisse a dactilógrafa de entrar para a família e herdar os zero vírgula oito do meu pai que elas julgavam que eram vinte e nove e era bom que julgassem e não me moessem o juízo com desconfianças e insinuações maldosas quando tudo o que fiz foi proteger a família e é conveniente, conhecida a obtusa ingratidão dos meus parentes, a família ignorar que está a ser protegida, as minhas irmãs e as minhas primas para mim, cambaleando de medo de se tornarem pobres como os pobres a quem davam camisolas e sopinhas ao domingo, de roda do espertalhão do prior, um vivaço e peras que até nem era feio e não havia ano que não comprasse um BMW novo à minha custa, as minhas irmãs e as minhas primas para mim, a girarem no gabinete num turbilhão de pó-de-arroz.

– E agora?

e eu a despachar processos, exausto daquele ciclone de chantungs (1)

– Aos oitenta anos o pai tem direito a divertir-se um bocadinho como lhe der na gana ou não tem?”

(não continua, é questão de pegar no livro)

(1)   nota minha de rodapé: “chantung” parece ser qualquer coisa como um tecido bastante decorativo, uma certa chinezice, segundo a minha breve consulta no Google…

António Lobo Antunes, O Manual dos Inquisidores, Lisboa, Dom Quixote, 1996, p. 108. X


Emily Dickinson – I'm nobody…





I'm nobody! Who are you?
Are you nobody, too?
Then there's a pair of us -- don't tell!
They'd banish -- you know!

How dreary to be somebody!
How public like a frog
To tell one's name the livelong day
To an admiring bog! 

Não sou ninguém! Quem és tu?
Também – tu não és – Ninguém?
Somos um par – nada digas!
Banir-nos-iam – não sabes?

Mas que horrível – ser-se Alguém!
Uma rã que o dia todo –
Coaxa em público o nome
Para quem a admira – o Lodo!

Tradução de Jorge de Sena
De um artigo de Luís Miguel Queirós – Público (Ípsilon) 27/ 01/2017) 





António Lobo Antunes, O Manual dos Inquisidores - excerto I

António Lobo Antunes, O Manual dos Inquisidores

Este foi transcrito agora, mas já conhecia

[…]

– É a última vez que venho aqui

ela a tirar-me cabelos da gola e a abraçar-me por trás

– Arranjaste um apartamentozinho para nós borracho?

e eu de olho no espelho concentrado em acabar o nó que detesto nós de gravata às três pancadas

– Acho que ficas melhor com o meu pai do que comigo ele tem mais tempo do que eu para te cuidar da carreira no teatro

os braços dela de súbito moles, a respiração a apressar-se-me na nuca, o turbante a desfazer-se, uma vozita infantil a tranquilizar-se a si própria, a conversar consigo mesma

– Estás a brincar comigo só podes estar a brincar comigo estás a brincar comigo não estás fofinho?

ao ir-me embora vi-a sentada na cama, de mandíbula caída, apertando a cabeça nas palmas numa incredulidade infinita

– Que parva eu sou

e tive de pedir à secretária que não me passasse as chamadas, de prevenir a segurança que a pusesse na rua no caso de aparecer no banco, escreveu-me uma carta de ameaças com mais erros de ortografia do que insultos e contudo, honra lhe seja feita, não era mentirosa ao afirmar que se dedicava a sério a um homem dado que acabou por instalar-se de armas e bagagens no Estoril para melhor amar o meu pai com uma fidelidade e uma dedicação sem limites, as minhas irmãs e as minhas primas visitavam o velho e eram recebidas por uma pulseira no tornozelo e um vestido de lycra a imitar leopardo que as tratava por coisinha, lhes oferecia cadeiras e fazia chiribibi no queixo do presidente honorário numa familiaridade conjugal
[…]”

Continua

António Lobo Antunes, O Manual dos Inquisidores, Lisboa, Dom Quixote, 1996, p. 107 e 108


domingo, 22 de janeiro de 2017

Edgar P. Jacobs, Blake and Mortimer – As 3 fórmulas do Prof. Sato (1ª ed. 1970) - excerto







Edgar P. Jacobs, Blake and Mortimer – As 3 fórmulas do Prof. Sato (1ª ed. 1970) 

Narrador: À voz de Sato, o andróide deteve-se de imediato…

Professor Sato: Muito bem… saia!...

OZU (andróide): OZU está às ordens do Sensei…

Narrador: Em seguida, depois de uma profunda vénia, desaparece…

Mortimer: By jove, isto é magia!!...

Prof. Sato: Não, é uma judiciosa combinação de electrónica, química e física…
Das minhas realizações, Ozu é aquela em que dominei completamente os problemas do movimento muscular. Nos outros andróides mais complexos, dediquei-me sobretudo à delicada regulação do cérebro artificial. Por último, para resolver a questão do voo comandado, contruí… um RYU [ver nota em baixo]…

Mortimer: Um Ryu?... Mas então, o Ryu de Hanéda era…

Prof. Sato: Infelizmente, sim! Era o protótipo em questão, do qual temos aqui uma fotografia…
Narrador: E no écran do laboratório surge repentinamente uma estranha forma
Prof. Sato: Subtilmente articulado o aparelho em voo tinha realmente o aspecto do monstro fabuloso das nossas lendas.

Mortimer: Acredito que sim.

Prof. Sato: Na própria noite da catástrofe, tinha procedido sobre a baía a uma série de ensaios plenamente conseguidos. Quando deixei o laboratório, o “dragão” estava estacionado, asas recolhidas, na conduta de lançamento, trancada…
Mas observe este plano. À esquerda, a consola de comando que controla todas as manobras. Lançamento, comando por rádio, etc. Depois, a seguir à linha de partenogénese electrónica e à câmara de ensaios, a referida conduta, que dá, através de uma porta camuflada para a baía de Sagami. Tudo isto era protegido por um dispositivo de segurança com módulos electrónicos.

Mortimer: Então como é que Ryu pôde escapar-se?

Prof. Sato: Aparentemente, a queda acidental de uma válvula de ventilação em cima de dois bornes terá feito um curto-circuito no sistema de arranque…

dragão japonês (日本の竜nihon-no-ryū?) ou dragão (ryū?) é uma criatura legendária de atributos físicos similares aos dos dragões chineses e coreanos. O ryū provém da China e é uma das quatro bestas divinas da mitologia japonesa. Frequentemente são emblemas de imperadores ou heróis, mas sobretudo representam a sabedoria, ao contrário dos dragões chineses, mais conhecido como "Lung". Sua aparência é muito diferente aos chineses: têm corpo de serpente, cabeça de crocodilo, escamas de lagarto, chifres de cervo, olhos de gato, nariz de salamandra, garras de águia, patas de lagarto, juba de leão e bigodes de bagre.
Na série Pokémon, os dragões (tais como Dragonair ou Rayquaza) são diversos tipos de dragão.





segunda-feira, 16 de janeiro de 2017

Bartleby – o escrivão … ou o “copista”… por Herman Melville I would prefer not to

Bartleby – o escrivão … ou o “copista”… por Herman Melville

I would prefer not to

esta mensagem foi primeiramente publicada no nosso mural do facebook...

excerto (para quem tenha pachorra de ler)… este foi hoje transcrito (copiado) para o word… mas deu gozo…calmamente e com exactidão, partilhando e relendo… depois copiar-colar…

“Poucos dias depois Bartleby terminou quatro extensos documentos, quadruplicado de depoimentos feitos perante mim [homem de leis – narrador], durante uma semana, no exercício das minhas funções no High Court of Chancery. Era necessário conferi-los. Tratava-se de um processo importante, exigia-se a maior exactidão. Tendo tudo preparado, chamei Turkey [Peru], Nippers [Tenazes] e Ginger Nut [(Bolo) de Gengibre] [“dois copistas – escrivães – e um moço de recados”], da outra sala, com o intuito de pôr cada uma das quatro cópias nas mãos de cada um dos meus quatro empregados, enquanto que eu leria o original. Já Turkey, Nippers e Ginger Nut tinham ocupado os seus lugares, cada um com o respectivo documento na mão, quando chamei por Bartleby, para que se juntasse a este interessante grupo.

– Bartleby! Depressa, estou à espera!

Ouvi o lento arrastar dos pés da cadeira no soalho nu, e pouco depois ele surgiu, de pé, à entrada do seu refúgio.

– O que é preciso? – perguntou calmamente.

– As cópias! As cópias! – exclamei eu, apressadamente. – Vamos conferi-las.

– Ali! E estendi-lhe uma quarta cópia.

– Preferiria de não [“I would prefer not to”; ou, p. ex., “preferiria não o fazer”] – respondeu, desaparecendo calmamente por trás do biombo.

Durante alguns instantes, vi-me transformado num pilar de sal, de pé à cabeça da minha coluna sentada de empregados. Recompondo-me, dirigi-me ao biombo, e inquiri da razão de tão extraordinária conduta.

– Por que se recusa? [“Por que” está em itálico, mas no FB não dá…]

– Preferiria de não.

Com qualquer outro indivíduo, ter-se ia apossado de mim uma cólera terrível, e sem gastar sequer mais palavras, tê-lo-ia enxotado ignominiosamente da minha presença. Mas havia qualquer coisa em Bartleby que não só estranhamente me desarmava, como também, de um modo singular, me tocava e desconcertava. Comecei a argumentar com ele.

– São as suas próprias cópias que vamos conferir. É trabalho que lhe poupamos, visto que bastará conferir uma vez. É prática comum. Todo o copista é obrigado a ajudar a conferir as suas próprias cópias. Não é assim? Mas não fala? Responda!

– Prefiro de não (“I prefer not to”) – respondeu, numa voz aflautada. Pareceu-me que, enquanto eu lhe falava, ele ia considerando cuidadosamente tudo quanto eu dizia; apreendendo completamente o sentido; e sem poder negar a inevitável conclusão; mas, ao mesmo tempo, uma qualquer consideração suprema o levava a responder como o tinha feito.”

[continua]

Herman Melville, Bartleby – O Escrivão, ed. De Giorgio Agamben e Pedro A. H. Paixão, trad. P. H. Paixão, Lisboa, Assírio & Alvim, 2007, pgs. 84 e 85.

Vou copiar-colar para um blogue, porque no fb ainda mais rapidamente fica esquecido…






segunda-feira, 2 de janeiro de 2017

Poemas de Manoel Tavares Rodrigues-Leal publicados no nº 17 da Nova Águia – Março 2016



Alguns dos poemas de Manoel Tavares Rodrigues-Leal publicados na revista Nova Águia nº 17

Revista Nova Águia, nº17, 1º semestre, 2016, p. 225, Sintra, Zéfiro.



(Perfil de Sophia)

reerguer o equilíbrio grego da beleza: medida
do homem e do mundo, eis a alquimia a embriaguez
de Sophia, consumida através do templo antigo do poema.

Lx.25-1-79
Caderno Limae Labor




Sophia (após leitura de Dual)

imagem fugidia
que emerge da antiguidade do dia,
e morre, insone e perpendicular,
irmã da unidade e da medida do olhar.

Lx. 18-3-73
Caderno Limae Labor

Sophia de Mello Breyner Andresen

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(a Alberto Caeiro)

Sê simples e calmo como Caeiro o era
Imperturbável percorre o teu caminho como o
        dia que amanhece
E se não distingue dos dias adiados e
        extintos como da recordação dos dias que
        meramente o serão

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(a Ricardo Reis)

No reino de Ricardo Reis
Cada instante efémero é intacto, transeunte e antigo.
A nítida ideia dos deuses emerge jovem e pagã
Como a opulenta arquitectura de um jardim
      suspenso na manhã.


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Alguns dados biográficos e outros
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