quarta-feira, 3 de maio de 2017

Luís de Barreiros Tavares, "O que são as Filosofias Nacionais?”, Revista Nova Águia, nº19, 1º semestre, 2017, pp. 206-213, Zéfiro.


                                       O que são as filosofias nacionais?

                                                 Luís de Barreiros Tavares


                                                                    I
                          

“Sócrates – Dizem, caro amigo, que os primeiros oráculos no templo de Zeus, em Dodona, foram feitos por um carvalho!  É evidente que os homens daquele tempo não eram tão sábios como os da nossa geração e, como eram ingénuos, o que um carvalho ou um rochedo dissessem tornava-se muito importante conquanto lhes parecesse verídico! Mas para ti talvez interesse saber quem disse determinada coisa e de que terra é natural, pois não te basta verificar se essa coisa é verdadeira ou falsa!”

(Platão, Fedro, 275 c, trad. Pinharanda Gomes, Lisboa, Guimarães, 1986)



Uma nota que me tem despertado alguma reflexão, dizendo respeito às filosofias nacionais[1]. A filosofia pretende-se também universal ecoando a afirmação de Aristóteles na Metafísica: “Só há ciência do universal (katholou).” Pois no contexto do Estagirita a ciência foi enunciada num âmbito mais abrangente abarcando a dimensão filosófica. Ora, mesmo que a filosofia tenha raízes na tradição ocidental greco-europeia, ela universalizou-se acrescendo ao chamado global. Global, quer na vertente anglo-saxónica, com a língua inglesa (estendendo-se aos EUA), quer na dita europeia, "continental" (designação atribuída pelos filósofos analíticos), curiosamente com a consolidação e expansão da língua inglesa para ambas. Pois muitos dos filósofos na Europa recorrem frequentemente ao inglês para alargarem o espectro do público e leitores, ou, como se diz hoje, para adquirirem mais “visibilidade”.
É que esta questão das línguas também tem que se lhe diga, embora eu não seja o mais competente para analisá-la. Mas a título pontual leiamos um interessante passo de Fernando Belo: “[…] a língua inglesa, que hoje presta excelentes serviços de língua internacional nas trocas comerciais, tecnologias e turismos, justamente por, apesar da sua origem saxónica, ser uma língua de muito pobre morfologia; mas também é essa característica que parece justificar a tendência empirista e pragmática dos textos anglófonos, a dificuldade dum intelectual inglês que uma vez me confessou não poder pensar sem o recurso aos latinismos da sua língua”[2].
Curiosamente, apesar de se supor que a filosofia é universalizante, permanece todavia qualquer coisa ao nível das línguas marcando-se pelo interesse ou pretensão em afirmar a filosofia segundo esta ou aquela língua. Com efeito, a filosofia tida geralmente como a mais divulgada e representativa, por assim dizer, move-se em autores alemães,  franceses, ingleses, poderíamos continuar pelos italianos, etc., passando depois por muitas outras nações e línguas incluindo Portugal, Brasil, etc. Mas a filosofia vai mesmo desde há umas boas décadas até aos EUA. Reiterando, pode dizer-se, mais do que nunca, que ela é universalizante e globalizou-se. Temos até um Slavoj Zizek, esloveno, que praticamente só fala inglês, Pop Star, Superstar da cultura com uma projecção mediática nunca vista até hoje, de Tóquio a Nova York. Ele move massas à escala da “teoria” e da “crítica da cultura”; veja-se o sucesso dos seus vídeos no Youtube. 
Mas voltemos ao universalizante. É que, a bem dizer, persiste a vontade de cada nação, principalmente – e curiosamente – as mais relevantes no panorama mundial, digamos assim, em reclamar para si, desta ou daquela maneira a preponderância do seu pensar, das suas mensagens, neste caso filosóficas. Quer dizer, a vontade de fazer-se representar, a vontade de representação da sua cultura em sentido lato, incluindo a dimensão filosófica. Isto com todas as polémicas e controvérsias que poderão suscitar hoje as formas de “fazer passar a mensagem”. Pois, saber actualmente quem joga ou, pelo contrário, é jogado, nisto de fazer passar a mensagem, ou quando ambas as instâncias parecem confundir-se de maneira ainda por pensar, constitui um tema que já por si faria correr muita tinta.
Por outro lado, é curioso que o inglês é o veículo mais facilitador, como acima tentámos exemplificar com a passagem de Fernando Belo. Seja-se francês (Alain Badiou, p.ex., vj. no Youtube o EGS - European Graduate School, fundado na Suíça), espanhol, italiano (p.ex. Giorgio Agamben[3] recorre ao inglês no EGS), alemão (p. ex., Peter Sloterdijk[4] e alguns outros que quase nunca prescindem da sua língua natal), etc. Mesmo hoje, em Portugal, opta-se pelo inglês em certos Colóquios, Congressos e outros eventos.
Mas retomando a questão central deste texto. Ora, não é curioso como o nacional se insinua por vezes no internacional? Por exemplo, Heidegger reclamava um eixo fundamental linguístico entre a língua alemã e a grega antiga. Sabendo nós que, automaticamente, partindo desta tese, se estabeleceria a ponte entre a origem, o chamado berço do pensamento filosófico europeu-ocidental (Grécia) e a filosofia alemã, quer dizer, entre a "filosofia grega" e a "filosofia alemã".
Dir-se-ia que Álvaro Ribeiro, em 1943, segue nesta linha (“tradução directa, exacta e inequívoca dos textos gregos e alemães”). Mas apenas como base de sustentação para outras questões. Ele refere – advertindo, ao mesmo tempo – a influência nos últimos séculos [na cultura portuguesa] do “intermediário francês”: “O primeiro trabalho será o de fixar a nomenclatura e de enriquecer o vocabulário, para que venha a ser possível a tradução directa, exacta e inequívoca dos textos gregos e alemães [filosofias grega e alemã, bem entendido]. Por demasiadamente se ter referido, nos últimos séculos, ao intermediário francês [filosofia francesa, por assim dizer], encontra-se o nosso vocabulário filosófico comprometido com postulados, definições e classificações que não pertencem à linha directriz da nossa espiritualidade; de tal facto resultam dois inconvenientes: o obstáculo à inteligência directa de outros tipos de mentalidade e a mudez inevitável de certas tendências latentes do pensamento nacional. Importa solver este problema de autêntica filologia” (Ribeiro, A., O Problema da Filosofia Portuguesa[5], 1943, p. 67). “Filologia”, e acrescentaríamos com uma designação actual: “Lusofonia”;
em continuidade: “Filosofia lusófona” (vj. nota de rodapé “6”).                                                                                                         
Voltando ao eixo filosófico greco-alemão segundo Heidegger. Não obstante admirar a obra deste grande pensador, pergunto-me: isto não é nacionalismo filosófico puro dissimulando-se no/com o Universal e no/com o Internacional (neste caso, e implicitamente, Alemanha e Grécia)? Para não falar no seu fito, segundo consta – fase passageira, é certo –, de se tornar o teórico ou um dos grandes teóricos e ideólogos, precisamente filosóficos do “Partido Nacional Socialista” alemão de Hitler com o seu Sein und Zeit e o Dasein[6].
E a filosofia da Grécia Antiga é universal, internacional ou nacional? Voltemos a Zizek. Goste-se ou não, ele tem uma projecção global (universal?) nos moldes dos nossos dias, sejam ou não os melhores, garantam ou não o devido peso. Há filosofia eslovena? Há mais de duas décadas Zizek candidatou-se à presidência da Eslovénia (1990), sem sucesso. Ele quereria servir a sua nação, o seu país, a sua pátria, ou, com isso, mais ainda a promoção da sua obra ganharia a força pretendida? O seu gesto pôde muito bem ser meritório e digno. Mas que megalomania insuspeitada ou nascente poderá por vezes estar subjacente a um filósofo seja ele produtor de uma grande obra filosófica, seja ele ou não um grande pensador? Que ideias estão por vezes por detrás? O exemplo que se deu acima de Heidegger  poderá ilustrar isso. Todavia, não esqueçamos que se faz aqui um levantamento de questões. Com efeito, Heidegger e a sua obra nem pouco mais ou menos se limitam àquele breve mas muito grave episódio. Mas adiante…
Se os “grandes” (autores e/ou nações) supostamente universais se reclamam, lá no fundo, nacionais, sem que por vezes nos demos bem conta ou peso disso, por que razão os pré-supostos “pequenos” não terão a legitimidade de se atribuírem a seu modo o nacional? E «o nacional é bom», como dizia um antigo anúncio publicitário. Mais, nestas questões quem define quem é grande e quem é pequeno, quem é universal e quem não o é? 
Retomando de um outro modo a questão controversa das filosofias nacionais, afinal, mais universais, e vice-versa, do que é comum pensar-se, como vamos tentando mostrar neste breve texto. Saber o que é uma filosofia nacional, comporta, já de si, indagar das condições de possibilidade, a questionar o que são filosofias nacionais. E isso vale para qualquer nação, pátria, como alguns sublinham, para qualquer língua que pensa. E não é um facto que permanentemente certas vertentes e tonalidades filosóficas nacionais se dissimulam sob a aparência do universal, seja qual for a nacionalidade, como já o tentámos mostrar?
Retomemos a questão, mostrou-se acima como por vezes algo tido como pensamento de teor não nacional e não nacionalista, pretensamente universal, poderá trazer, ou pretender trazer consigo indícios linguísticos nacionais e nacionalistas. Duplo movimento complexo. Eis o que importa também pensar nestes contextos. O que importa reflectir sobre estes movimentos de pensamento, sejam propósitos dignos ou não.
A filosofia dita portuguesa – ou “lusófona”, como pertinentemente é hoje ventilado[7] – não tem qualquer prioridade sobre a perspectivação de outra filosofia hipoteticamente nacional. Nem, pelo contrário, qualquer outra sobre ela. Quer dizer, mais uma vez, importa a questão enquanto tal. Interrogação, questão da questão, abrindo, por si mesma, espaço e tempo de pensamento.
José Marinho no seu texto “Filosofia Portuguesa e Universalidade da Filosofia” na linha de Álvaro Ribeiro em O Problema da Filosofia Portuguesa (ver acima) ilustra muito bem a problemática implícita das filosofias nacionais, focando a da filosofia portuguesa e a universalidade da filosofia dando o seguinte exemplo: “Que o haver laranjas de Setúbal, assim como nos permite e nos autoriza chamar-lhes laranjas portuguesas do mesmo passo aos deliciosos frutos e seu conceito não retira à forma única e universal sabor ou sentido”[8]. Curiosamente há três instâncias: "laranjas de Setúbal", "laranjas portuguesas" e as laranjas, cujo sabor e sentido é universal. Antes, na p.9 pode ler-se: “Alguns dos homens mais inteligentes do País colocam-nos na urgência de examinar a questão.” De examinar, de questionar a questão. Mas também questionar a potência da indignação pelo facto de essa mesma questão ser impossibilitada, a priori, ou de considerar-se que não vale a pena, por pressupostos estabelecidos, dados e adquiridos, ou por se supor à partida uma questão menor. A par disto, qual a viabilidade de pensar “o que é isso, da filosofia”? Quer dizer, “ o que é isso, da – a que se chama, quer dizer, que dá pelo nome de – “filosofia”? Ou por outra: o que é isso, aquilo (o que) a que se dá o nome de “filosofia”? Pergunta fundamental, indagando sobre a própria pergunta sobre o nome ou palavra “filosofia”. “Que é isso, da filosofia?” De outro modo, esta questão talvez abra caminho à reformulação da questão “o que é”, reformulando-a sobre a primeira: “o que é (isso, da - de a) filosofia?”.  E: “o que é isso, do ser?”. Para Aristóteles é a pergunta fundamental da filosofia a par do que é a “substância” (Metafísica, 1028 b)[9].
É preciso também desmistificar a palavra "filosofia". E de alguma maneira desmitificá-la. Por outro lado, a Filosofia traz o Logos sobre o Muthos. No entanto, quem nos assegura que este não se insurge naquele, só por os confundirmos de tanto os distinguirmos? Poderemos ver então outra reformulação de como Muthos e Logos podem encontrar um novo nexo ou um novo diálogo. Não é isto que nos podem trazer felizmente certas leituras e vertentes constitutivas da chamada Filosofia Portuguesa? Não é ela por alguns vista como tendendo exclusivamente para o Mito?
Mas, por vezes os filósofos tendem a personificar a Filosofia sem dar por isso. Tão-pouco ela é uma entidade. Pois a entificação da Filosofia poderá traduzir um complexo de superioridade da mesma.
Quando Heidegger pergunta pelo sentido do ser no início de Ser e Tempo – na esteira da diferença ontológica fundamental do ser e do ente, e da sua crítica da onto-teo-logia metafísica do Ser como ente[10] – essa pergunta não se traduzirá também na potência da pergunta na sua multiplicidade de perguntas possíveis sobre si mesma e sobre o ser como sentido? 
Voltando à questão filosofias nacionais/filosofias internacionais. Esta questão não se constituirá, portanto, no questionamento legítimo sobre, precisamente, o questionar acerca da possibilidade de eventuais ou virtuais elementos nacionais, legítimos ou não e estruturais também, dos mais variados, em qualquer filosofia? Foi o que se tentou mostrar nesta primeira parte. Pode parecer redundante, repetitiva esta série de questões. Mas questionar implica também um recuar re-forçado, instalando, correlativamente, uma força de avanço, de balanço que constitui o buscar, o pesquisar enquanto potência de repetição, abrindo-se como futuro. Em nosso entender o levantamento destas questões é pois pertinente. 
                                                          

                                                             
                                                                II


                     

“Para começar, agradeço o facto de me considerarem paradoxal. Como vejo sempre no heterodoxo o ortodoxo do outro lado, creio que aquilo que realmente nos pode unir é o paradoxal. O existir e não existir ao mesmo tempo é, do meu ponto de vista, a união final das coisas, e isso é o paradoxal.”

(Agostinho da Silva[11])


Há paradoxos e paradoxos. E Agostinho da Silva compreendeu bem isso. A indignação perante uma certa impossibilidade de pensar, incutida, através de preconceitos (pré-conceitos) muitas vezes insuspeitáveis, garante a indagação sobre a questão que, ao questionar e questionar-se por si/e a si mesma, abre-se a outra, a outras questões que à partida eram tidas como inquestionáveis e não pertinentes nesse contexto. Evocamos aqui a potência do espanto (thaumazein; vj. Aristóteles, Metafísica. A2: "as coisas serem como são"). Espanto, questionamento originário, constituindo-se como interrogação (de certo modo negação latente) e exclamação (de certo modo afirmação latente). Constatação já de um certo saber e não saber.
Todavia, o espanto é motivo para os homens filosofarem, segundo o estagirita (vj. também Platão Teeteto 155d)[12]. Para não falar no grande Sócrates.
Retomemos a primeira epígrafe da 1ª parte deste texto: “Sócrates – Dizem, caro amigo, que os primeiros oráculos no templo de Zeus, em Dodona, foram feitos por um carvalho!  É evidente que os homens daquele tempo não eram tão sábios como os da nossa geração e, como eram ingénuos, o que um carvalho ou um rochedo dissessem tornava-se muito importante conquanto lhes parecesse verídico! Mas para ti talvez interesse saber quem disse determinada coisa e de que terra é natural, pois não te basta verificar se essa coisa é verdadeira ou falsa!” (Platão, Fedro, 275 c).
Nada mais favorável. O dado adquirido e o nome sonante - ou tornado sonante - vão de par. Mas o nome sonante pode tornar-se a qualquer momento uma colagem. Porque ao nome pode colar-se a imagem e o texto. E pode ocorrer que, às tantas, já não lemos o texto mas o nome; ou pior, um acréscimo ocorre como pura imagem de marca, e de um certo mercado, como é óbvio! Às vezes somos antecipados por colagens de nomes a significados. É o que mostra o passo do Fedro acima citado: Mas para ti talvez interesse saber quem disse determinada coisa e de que terra é natural, pois não te basta verificar se essa coisa é verdadeira ou falsa!”[13].
O seguidismo daqueles que, raramente abrindo excepções, seguem sempre nomes estrangeiros, ainda que nomes de várias origens, países ou continentes, não estarão, no revés, a ser nacionalistas, portanto, pela negativa? Estranhos nomes, e quanto mais estranhos melhor. Com dificuldade mas deleite em pronunciá-los, com muito estilo. Noutro plano, o exemplo do futebol é ilustrativo. Com os novos nomes esquisitos que vêm lá de fora no início de cada época, etc., aparecendo nas manchetes dos jornais desportivos. Porquê?
Voltemos à filosofia. Porque no internacionalismo universalizante das suas opções, ou, se quisermos, a qualquer área da cultura – quando é numa certa tendência pretensamente estrangeirada – só dão relevância ao que é exclusivamente, e a priori, de outra nacionalidade que não a sua.
Não só são nacionalistas pela negativa. São, antes, um estranho avesso. Um avesso ainda impensado. Portanto, não dão conta que recaem de alguma maneira no desnível (as subestimações culturais em sentido lato) que pré-supõem, e de que pretensamente se julgam excluir, incluindo-se. É nesse deslize – nesse descair desfavorável, e que não é um assentar de impulso – que a força daqueles mesmos que desfavorecem, se enfraquece e se auto-substima, ou seja, a começar evidentemente por eles. Isto para aqueles que, tendencialmente, têm por sistema dizerem e/ou pensarem mal do seu país, seja ele qual for (de ‘X’ país, de ‘X’ nação, etc.). Alguma analogia poderemos encontrar no seguinte passo de Fernando Pessoa abrindo um texto (“Contra a ‘Síndroma Provinciana’ – ‘O provincianismo português’”(1928)[14]): “De igual doença enfermam muitos outros países, que se consideram civilizantes com orgulho e erro.” Mas só lendo o texto de Pessoa poderemos ter eventualmente uma noção do contexto e do seu alcance como chamada de atenção (“Contra a…”).
Falamos daqueles que maldizem num regime de argumentação banalizado, acrítico (e isto também atinge gente dita de cultura), dizendo todos mais ou menos o mesmo acerca de um determinado conjunto (conjunto de pessoas; poderemos pensar aqui na teoria dos conjuntos em matemática?), sem darem conta disso, mas afinal pertencendo-lhe (a esse conjunto), cada um supondo excluir-se dos outros. Esta expressão, tão frequente em Portugal, é sintomática e esclarecedora: “É o país que somos.” Estranho paradoxo. Mas, até a Europa, hoje, não anda a mirar-se muito bem ao espelho…
Por outras palavras, e reiterando, estarão a ser nacionalistas do avesso. Uma vez que, no que respeita a vários campos do saber, nomeadamente a filosofia, que é o que aqui está principalmente em causa, seguem sempre, ou quase sempre, o que é estrangeiro como prioritário e, por pré-conceito, de maior grandeza de pensamento. Quer dizer, algo que se traduz como regra geral no modo de pensar por parte de certas camadas, intelectualizadas ou não[15].
Por outro lado, é evidente que a autocrítica e o espírito crítico são essenciais[16].
Mas não é interessante que alguns supostamente tidos por “estrangeirados” acusem de provincianismo alguns supostamente tidos por “não-estrangeirados”, e reciprocamente? Fernando Pessoa também falou do provincianismo português. Evidentemente que estas questões dão que pensar. E haverá com certeza que ter em conta argumentos possíveis de ambas as partes. Mas não avancemos muito sobre isto. Indica-se apenas mais uma passagem, o último parágrafo de “Contra a ‘Síndroma Provinciana’ – ‘O provincianismo português’”, para se ler mais: “Para o provincianismo há só uma terapêutica: é o saber que ele existe. O provincianismo vive da inconsciência; de nos supormos civilizados quando o não somos, de nos supormos civilizados precisamente pelas qualidades por que o não somos. O princípio da cura está na consciência da doença, o da verdade no conhecimento do erro. Quando um doido sabe que está doido, já não está doido. Estamos perto de acordar, disse Novalis, quando sonhamos que sonhamos.”
Todavia, de um certo modo, para fazer face a estas questões é preciso saber pô-las, também, de lado, defendendo pontualmente que o problema essencial não é esse. Convém mesmo guardar silêncio de vez em quando, e não embarcar sempre nesse barco de discussões. A palavra também guarda silêncio. Ou, por outras palavras, fazer suspensão, epochê, ou ‘redução’ do problema, para pensar na linguagem de Husserl. É que todo e qualquer problema pode tornar-se circularmente fechado. A sua abertura permite pensá-lo sob múltiplos ângulos.
A filosofia, desde a sua instalação na tradição greco-europeia-ocidental caracteriza-se em grande parte pela abstracção (aphairesis) definida por Aristóteles: “pensamento das coisas que estão incorporadas na matéria como se não estivessem” (Aristóteles, De anima, III, 431b). Mas a abstracção pode por vezes incorrer em perdas de sentido das coisas. Não será ela um dos possíveis problemas da metafísica? A filosofia corre esse risco. As abstracções dos rótulos e das etiquetas, paradoxal e incompreendidamente coisificados, concretizados. Seja na filosofia espanhola, chinesa, francesa, holandesa, dinamarquesa, alemã, mexicana, portuguesa, filipina, angolana, belga, austríaca, peruana, coreana, ou lá o que se queira, etc. 
Este texto que aqui escrevemos também pode padecer de abstracções a muitos olhos. Mas, há várias abstracções, que Pessoa, por exemplo, faz questão de frisar. Veja-se o seu texto “Princípios do Sensacionismo” no âmbito da reflexão sobre a arte, onde pode ler-se: “Assim, a arte tem por assunto, não a realidade (de resto, não há realidade, mas apenas sensações artificialmente coordenadas), não a emoção (de resto, não há propriamente emoção, mas apenas sensações de emoção), mas abstracção. Não a abstracção pura, que gera a metafísica, mas a abstracção criadora, a abstracção em movimento. Ao passo que a filosofia é estática, a arte é dinâmica; é mesmo essa a única diferença entre a arte e a filosofia” (Páginas Sobre Literatura e Estética, ed. Europa-América, org. António Quadros, 1986)[17].
Mas, por vezes é preciso pensar: “já não é de certas questões que se trata.” Ou melhor, a sê-lo, trata-se antes de questionar sobre o modo como elas já diferentemente devem ser questionadas, quer dizer, reformuladas. Uma vez que já não fazem sentido nem sequer existem segundo certas perspectivas ou momentos. É que por vezes não é ocasião para certas questões. Dar azo a que as questões possam sempre outrar-se, para usar um termo de Pessoa. Pessoa que não saiu de Lisboa, excepto quando foi para Durban viver a sua infância e primeira juventude, voltando depois. Pessoa, nos nossos dias lido de Tóquio a Nova York. Pessoa que também escreveu sobre o Quinto Império, correlativo, como se sabe, do Espírito e dos Mares,  que Agostinho da Silva tanto e tão bem pensou[18]. Pessoa poeta, cujo pensamento produz infindáveis leituras. Aliás, não haverá pensamento e filosofia em Pessoa, mesmo na sua escrita poética, na sua arte de escrita?
O filósofo francês Alain Badiou, na abertura do seu texto “Uma Tarefa Filosófica: Ser Contemporâneo de Pessoa”, escreve: “Pessoa, falecido em 1935, só foi conhecido em França, de forma um pouco mais vasta, cinquenta anos mais tarde. Eu incluo-me nesta demora escandalosa. Porque se trata dum dos poetas decisivos deste século e, particularmente, se se procurar pensá-lo como condição possível da filosofia.” E na segunda página: “Impõe-se, assim concluir que a filosofia não está, não está ainda, condicionada a Pessoa. Ela não pensa ainda à altura de Pessoa.” E: “Sustentaremos que a linha de pensamento singular desenvolvida por Pessoa é tal, que nenhuma das figuras estabelecidas da modernidade filosófica está apta a suportar a sua tensão” (Meditações Filosóficas – Pequeno Manual de Inestética, Vol. II, trad. Joana Chaves, ed. Inst. Piaget, 1999)[19]. Por outro lado, é curioso que José Gil, no seu livro Diferença e Negação na Poesia de Fernando Pessoa, Relógio D’Água, 1999, p.133, escreva: “”O pensamento” de Fernando Pessoa não existe, se entendermos a expressão no sentido de um todo sistemático e fechado, logicamente coerente e acabado.” E mais à frente acrescenta citando-o e comentando: “Ele mesmo, reivindicou o direito de ‘mudar de filosofia como quem muda de camisa’. Além do mais, a sua coerência e sistematicidade são de uma outra natureza.“ (op. cit. p.133). Aproveitando estas linhas sobre Pessoa, citamos um passo do livro de Renato Epifânio (Via Aberta): “Quem considera que Pessoa não é um filósofo por essa razão [“de que jamais forjou um “sistema filosófico” propriamente dito”] tem, no entanto, que atender ao seguinte: se, efectivamente, Pessoa jamais forjou um “sistema filosófico” propriamente dito, isso, em si mesmo, no caso pessoano, é já uma posição filosófica. Com efeito, se há alguma tese que Pessoa, em nome próprio ou heteronimamente, sustenta, procura sustentar, ao longo de todas estas páginas [“Textos Filosóficos”], é, precisamente, a da impossibilidade – filosófica, saliente-se – de forjar, de fundar, um “sistema filosófico””[20].
A questão da filosofia portuguesa é uma entre as muitas questões da filosofia e do pensamento em Portugal[21]. Estas questões carecem de discussão com outras que não portuguesas que não em Portugal, não importa de onde. Deste modo, a questão sobre a questão da ‘filosofia’ talvez fizesse mais sentido. Como? Pondo-a, de vez em quando, a par daquelas, as filosofias nacionais e as internacionais, colocando em diálogo muitas questões imprevistas e novas, garantindo uma melhor compreensão do mundo na sua espantosa interrogação. Mas por cá parece haver agora qualquer coisa como uma lufada de ar fresco que nos faz pensar melhor e de outro modo estas e outras questões como forças de pensamento e de filosofia.


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Referências:

Aristóteles, Metafísica, ed. trilingue [grego, latim, castelhano], trad. Valentin García Yebra, Madrid, ed. Gredos, 1990.

Aristote, De l'Âme, trad. nouvelle et notes J. Tricot, Vrin, 1934.

Badiou, A., Petit Manuel d’Inesthétique, Paris, Seuil, (1ª ed. 1998)); ed. portuguesa: Meditações Filosóficas – Pequeno Manual de Inestética, Vol. II, trad. Joana Chaves, Lisboa, ed. Inst. Piaget, 1999).

Badiou, A., Le siècle, Paris, Seuil, 2005.

Epifânio, R., Via Aberta, de Marinho a Pessoa, da Finisterra ao Oriente, Sintra, Zéfiro, 2009.

Gil, J., Diferença e Negação na Poesia de Fernando Pessoa, Lisboa, Relógio D’Água, 1999.

Heidegger, M., Être et Temps, trad. François Vezin, Ed. Gallimard, 1986.

Marinho, J., Estudos Sobre o Pensamento Português Contemporâneo, Biblioteca Nacional.

Pessoa, F., Páginas Sobre Literatura e Estética, Lisboa, Europa-América, org. António Quadros, 1986.

Pessoa, F., Textos de Intervenção Social e Culturala ficção dos heterónimos, Lisboa, Europa-América, org. António Quadros, 1986.

Platon, Théétète, trad. E.Chambry, Paris, Flammarion, 1967.

Platão, Fedro, 275 c, trad. Pinharanda Gomes, Lisboa, Guimarães, 1986.

Ribeiro, A., O Problema da Filosofia Portuguesa, Lisboa, Inquérito, 1943.
Santo, Luís C. do E., Vivências, Cartas da América, Lisboa, Ésquilo, 1998.

Silva, A. (Entrevista a Agostinho da Silva) in Revista Filosofia (Sociedade Portuguesa de Filosofia), nº2, 1986.
Tavares, L. B., «Homenagem a Luís do Espírito Santo, Leitor de Leonardo Coimbra», in revista Nova Águia, nº11, 1º semestre, 2013, pp. 98-99, Zéfiro. http://escrita-fone.blogspot.pt/search?q=lu%C3%ADs+do+esp%C3%ADrito+santo
Tavares, L. B., «António Quadros, Leitor e Divulgador de Fernando Pessoa», in revista Nova Águia, nº12, 2º semestre, 2013, pp. 57-58, Zéfiro. http://escrita-fone.blogspot.pt/search?q=ant%C3%B3nio+quadros








[1] Este ensaio foi publicado em duas partes (“I” e “II”) em datas diferentes no blogue Milhafre, tendo entretanto sofrido uma revisão e acrescentos significativos para a presente publicação.

[3] Agamben tendo já tecido alguns subtis comentários em relação ao predomínio do inglês: Giorgio Agamben. Resistance in Art. 2014 (EGS – European Graduate School) (https://www.youtube.com/watch?v=one7mE-8y9c&t=1814s). Traduzamos: “… gostava de vos lembrar algo que parece óbvio; ou seja: que eu irei pronunciar-me em inglês”; “…mas como o inglês não é a língua com que penso, certamente algo de relevante irá perder-se”;  “hoje, geralmente há a dominância do inglês em conferências, universidades e em lugares deste tipo”; “isto não deve ser considerado de modo inocente…“; “ …o inglês é usado como uma espécie de língua franca, tal como o latim foi usado na Europa nos séculos XV, XVI…”; “… mas o latim não pertencia a nenhum país em particular…”...
[4] Embora Sloterdijk fale por vezes em francês e inglês.
[5] Fui amigo do Professor Luís Carlos do Espírito Santo (1925-2000), que pertenceu ao Grupo da Filosofia Portuguesa, tendo sido discípulo de Álvaro Ribeiro e de José Marinho, discípulos de Leonardo Coimbra. Luís do Espírito Santo participou no memorável Colóquio “O Ideal Português” (1961) que decorreu na sequência da suspensão                
da célebre publicação do “Movimento 57” (Movimento da Cultura Portuguesa, 1957-62) dirigido por António Quadros. Além deles, participaram  Fernando Silvan, Fernando Morgado, António Braz Teixeira, Francisco Sotto Mayor, Alexandre Coelho e Francisco da Cunha Leão. Estes e muitos outros dados foram vivamente recordados por quem assistiu ainda muito jovem àquele importante encontro, o meu prezado amigo Pinharanda Gomes na sua interessante conferência no recente Colóquio sobre António Quadros em Maio de 2013 e que tivemos o privilégio de registar em vídeo: http://youtu.be/jIncQXq9IhQ. Veja-se também: Luís de Barreiros Tavares, «Homenagem a Luís do Espírito Santo, Leitor de Leonardo Coimbra», in revista Nova Águia, nº11, 1º semestre, 2013, pp. 98-99. Zéfiro. http://escrita-fone.blogspot.pt/search?q=lu%C3%ADs+do+esp%C3%ADrito+santo . Luís de Barreiros Tavares, «António Quadros, Leitor e Divulgador de Fernando Pessoa», in revista Nova Águia, nº12, 2º semestre, 2013, pp. 57-58, Zéfiro. http://escrita-fone.blogspot.pt/search?q=ant%C3%B3nio+quadros .
[6] A este propósito vj. o interessante documentário sobre Heidegger, com depoimentos de George Steiner, Hans Georg Gadamer, Richard Rorty, entre outros: https://www.youtube.com/watch?v=2Q3xy9TzY9E.
Os “cadernos negros” ou “diários privados”, recentemente publicados (2013-2015), atestam-no vincadamente, quer queiramos ou não…

[7] Renato Epifânio tem preconizado esta designação; ela é mais abrangente, ao mesmo tempo linguística e internacionalmente, bem como num alargamento no tempo e na história. Veja-se, p. ex., um excerto do editorial do nº 16 da revista Nova Águia, intitulado “Quem TEM MEDO DA FILOSOFIA LUSÓFONA? NOS 100 ANOS DO FALECIMENTO DE SAMPAIO BRUNO”: “Em 2015 assinalam-se os 100 anos do falecimento de Sampaio Bruno e, naturalmente, a Nova Águia, ao contrário da generalidade das revistas culturais, que insistem em ignorar o que mais importa, dá o devido destaque a essa que foi, sem dúvida, uma das figuras mais marcantes da Filosofia Lusófona…” http://www.zefiro.pt/livro_novaaguia016.htm . Vj. também “Pensamento lusófono”.

[8] José Marinho, Estudos Sobre o Pensamento Português Contemporâneo, Biblioteca Nacional, p.10.
[9] o problema fundamental da filosofia consiste na pergunta pelo ser, que é, afinal, a pergunta pela ousia” (Met. 1028 b). 
[10] Tentando explicitar brevemente diríamos que o ser como/enquanto ente abriu caminho para a tradição da metafísica ocidental que, segundo Heidegger, esqueceu o 'sentido do ser' (vj. Sein und Zeit) na medida em que o ser era compreendido, em última análise, precisamente como/enquanto ente. Ser era ente, de um modo geral. Ente herdado, por exemplo, do ser da Ideia (Idea - indicativamente ontológica) platónica e do ser teológico medieval, escolástico, com expressão máxima em Aquino. Donde a crítica heideggeriana da onto-teo-logia. Vj. http://blogoscomfbeloperguntaserespostas.blogspot.pt/search?q=onto-teo-logia
[11] Numa entrevista a Agostinho da Silva publicada em 1986 na Revista Filosofia (Sociedade Portuguesa de Filosofia), nº2, pp 149-183. Entrevista concedida pelo filósofo em sua casa a Joel Serrão, João Lopes Alves, Nuno Nabais, António Braz Teixeira e José Pedro Serra. Vale a pena citar as linhas seguintes: "Como no exemplo da geometria analítica, que já referi, esse mundo de paradoxos no qual posso pensar simultaneamente os registos da extensão espacial e da matemática pura. Considerando-me paradoxal, dirigem-me o melhor elogio que eu poderia esperar." E terminando a entrevista na página seguinte: "Importante é instalarmo-nos no paradoxo. Medo tenho eu do ortodoxo e do heterodoxo, que me coibiriam de fazer algo que muito me agrada: poder conversar com pessoas de vários pensamentos, várias atitudes, com a capacidade de as entender em si mesmas, sobretudo quando alguma me aparece com sinal inteiramente contrário ao meu. Quem sabe se precisamente esse, que alguém diria ser enviado do diabo, não é um dos disfarces do divino."
[12] Para thauma, v. Platão Teeteto 155d (além de Arist. Met. A2: o espanto é "as coisas serem como são"). “Nos dois, o "espanto" parece ser gerado pelo envolvimento do 'saber' com o 'não saber'” (comentário de José Trindade Santos numa conversa que tivemos  em “questões por e-mail – com José Trindade Santos: http://escrita-fone.blogspot.pt/search?q=o+espanto+%2B+jos%C3%A9+trindade+santos).

[13] Foucault escreveu um texto interessante sobre o “nome de autor” (“O que é um autor”). Mas certamente haverá ainda muito por escrever sobre este tema.
[14] Cf. Textos de Intervenção Social e Cultural…, ed. Europa-América, org. António Quadros, 1986, p.115. Este texto poderá ler-se na seguinte ligação: http://www.citador.pt/textos/o-provincianismo-portugues-i-fernando-pessoa.
[15] Diríamos, um tanto parodicamente, que um certo tipo de estrangeirado – mais, ou menos – pensante, se deixa fascinar, enfeitiçar, por nomes que soem estranhos (e, como sabemos, xenos, do grego, tanto pode significar estranho como estrangeiro… nestes casos, uma certa xenofilia, digamos assim…
[16] Não será nessa perspectiva – filosófica, entre outras – que Álvaro Ribeiro cita e comenta Sant’Anna Dionísio? “Não acreditemos, pois, que sobre nós pese uma invencível incapacidade. Fixemos, sim, os olhos na certeza de que para nós está aberta a possibilidade de contribuirmos para a cultura humana como a quaisquer outros núcleos ou gerações humanas” (Sant’Anna Dionísio, A não-cooperação da inteligência ibérica na criação das ciências, Lisboa, 1941, pp. 25 e 47, citado em Álvaro Ribeiro, Op, cit., pp. 20 e 21). “Formular tal opinião é já dar a oportunidade de a rectificar; por isso os três depoimentos citados [Sampaio Bruno, Fidelino de Figueiredo e Sant’Anna Dionísio] valem também pela preocupação que denotam, e podem ser interpretados como sinais negativos, mas precursores da era da novidade para a filosofia nacional” (Idem, p. 21).

[17] Veja-se também, a propósito, o seu texto “Apontamentos para uma estética não-aristotélica” (Textos de Intervenção Social e Cultural…, p. 230).
[18] "Agostinho da Silva - Ele Próprio" - Filmado por António Escudeiro - Edição integral: https://youtu.be/UUDZ9GN-YlI.
[19] A título de exemplo, apresentemos um dos vários argumentos de Badiou relativamente à Ode Marítima (“Um dos maiores poemas de Campos (e de todo o século)”: “Encontramos no heterónimo Campos, singularmente nas grandes odes, e é o que autoriza a hipótese de Gil [José Gil], a aparência de um vitalismo desencadeado [déchaîné]. A exasperação da sensação parece ser o processo maior da pesquisa poética, e a exposição do corpo ao seu desmembramento multiforme evoca a indentidade virtual do desejo e da intuição. Uma ideia genial de Campos é também a de mostrar que a oposição clássica do maquinismo e do élan vital [aqui numa alusão a Bergson] é muito relativa. Campos é o poeta do maquinismo moderno e das grandes metrópoles, ou da actividade comercial, bancária, fabril, concebidos como dispositivos de criação, como analogias naturais. Ele pensa, bem antes de Deleuze, que há no desejo uma espécie de univocidade maquínica, cujo poema deve captar a energia sem a sublimar nem idealizar, sem tão-pouco a dispersar num esquivo equívoco, mas nela alcançando os fluxos e os cortes, mesmo numa espécie de furor do ser”.  Traduzimos partindo do original francês (Alain Badiou, Petit Manuel d’Inesthétique, Paris, Seuil, (1ª ed. 1998)) e da versão portuguesa referida acima. Ver também Alain Badiou, Le siècle, Ed. Seuil, 2005.
[20] No capítulo III, “Pessoa, o filósofo do outro de nós mesmos, o filósofo da nossa finisterra”, in Via Aberta, de Marinho a Pessoa, da Finisterra ao Oriente, Zéfiro, 2009, pp. 57-58.
[21] Evidentemente que estes problemas têm implicações políticas; para não falar nas culturais, sociais, em sentido lato, entre outras.




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