Luís Tavares, «Homenagem a Luís do Espírito Santo, Leitor de Leonardo Coimbra», in revista Nova Águia, nº11, 1º semestre, 2013, pp. 98-99, Zéfiro.
Fui amigo do Professor Luís do Espírito Santo. Pertenceu ao grupo da
Filosofia Portuguesa, tendo sido discípulo de Álvaro Ribeiro e de José Marinho,
discípulos de Leonardo Coimbra.
Luís do Espírito Santo foi leitor atento e grande admirador da obra de
Leonardo Coimbra. Conviveu com muitos outros pensadores daquele movimento como
pode atestar a fotografia publicada no nº 8 da Revista Nova Águia, bem como um
livro seu incluindo cartas enviadas a
António Quadros, Jorge Preto, Agostinho da Silva, Orlando Vitorino entre
outros, tais como os primeiros acima citados (Vivências, Ésquilo, 1998).
Deixo aqui a minha breve e modesta mas atenciosa homenagem a Luís do
Espírito Santo que conheci quando encetava uma nova fase de publicações e
estudos mais aprofundados após alguns interregnos por força das circunstâncias
da sua vida. Antes, nas décadas de 50 e 60, havia publicado em revistas da
especialidade juntamente com alguns elementos do grupo da Filosofia Portuguesa.
Entre traduções (Platão, República,
Guimarães Editora, etc.) publicou o livro Filosofia
e Política (Rev. Gil Vicente, Guimarães).
Nesta nova e última fase foram publicados três livros (O Amor em Debate - posfácio de
Pinharanda Gomes, 1998 -, Vivências
(1998) e Estudos Comparativos: Henri Bergson – Leonardo Coimbra , todos na Editora Ésquilo),
dos quais pude acompanhar a feitura quando nos encontrávamos e conversávamos nos
cafés (aos Anjos, em Lisboa). Estes precediam um livro de maior fôlego com
cerca de quinhentas páginas sobre várias temáticas, entre as quais os
Templários e o Convento de Cristo em Tomar. Mas infelizmente o seu falecimento
impediu a sua publicação, uma vez que alguns dos manuscritos parecem ter sido
votados ao esquecimento.
Seguem-se algumas citações do seu livro sobre Henri Bergson e Leonardo
Coimbra ( dedicado ao “Mestre Álvaro Ribeiro e ao Amigo António Quadros”),
dando testemunho da sua grande admiração pelo filósofo e pensador português,
juntando leituras e reflexões suas, fragmentos do próprio Leonardo Coimbra e
umas referências por Manuel Barbosa da Costa Freitas:
“O Filósofo do “Criacionismo”, e autor da “Alegria, A Dor e a Graça”, do
“Diálogo do Amor e da Morte”, em seu permanente sopro de humanismo,
empenhava-se sobretudo em espiritualizar o homem, em o levar a cumprir o seu
destino transcendente, em o arrancar do egoísmo, da inércia, do cepticismo
suicida, para o projectar no mundo das luzes imarcescíveis, nas rotas da sua
plena realização social e metafísica, sem o que a vida não vale a pena ser
vivida.
Assim criou um mundo. Um mundo maior do que o Mundo” (p.43).
“Num livro muito interessante, “As religiões da Lusitânia”, de Leite de
Vasconcelos, podemos verificar que as crenças de natureza mitraica, bem como o
espírito panteísta, e ainda certas crenças e práticas dos “cátaros”, o
Evangelho de S. João e o “Marcianismo”, impregnaram toda a natureza do
pensamento religioso português.”
“Os templos portugueses são concebidos de tal modo que quem neles
permaneça, medite e reze sentir-se-á como se ali fosse o centro do Universo.
Gravados sobre as colunas e nos próprios muros, estão os símbolos da natureza
animal, vegetal e mineral que parecem participar activamente da vida universal
que o templo simboliza, e, conterem mensagens do passado que cumpre decifrar. O
ser humano, ali, é possuído por uma profunda quietude de alma. Pensamos mesmo
que deve ter sido num templo português que Leonardo conheceu a presença
individual de Deus, quando, durante a infância, acompanhava ao Domingo, os seus
familiares à Igreja. Talvez mesmo, durante a vida, o nosso filósofo ali
acorresse para melhor e mais sossegadamente pensar o plano das suas obras.
Em Portugal o templo é um lugar onde, em recolhimento, como que sentimos a
presença e a assistência de Deus. Ali, o nosso pensamento, encontra o bom
caminho.
As meditações de Leonardo devem ter sido tão calorosas como foram os seus
discursos, a todo o instante nos seus escritos encontramos beleza, calor e
bondade” (pp. 52 e 53).
“Leonardo, no Criacionismo, afirma […] “o pensamento é portanto
criacionista não porque crie a realidade, mas porque a sua adaptação à vida
social é obra da sua liberdade efectiva, isto é, da sua acção solidária. E assim
é uma permanente criação.”
“M.B. da Costa Freitas, na pág. 6 do livro “O Pensamento Filosófico de
Leonardo Coimbra”, diz que o Criacionismo “afirma resultar do conhecimento duma
actividade racional que elabora intuições, garantindo assim o espírito” (p.62).
“Leonardo afirma “quando apreendo
uma flor será ela criação da minha sensibilidade ou entendimento?...”
“Não existirá
em si uma actividade genésica que a flor actualiza?...”
“Existe e não
sou eu que a crio tomando dela conhecimento; a minha consciência é que revive
as relações que constituem essa realidade e tal é a qualidade do criacionismo
do nosso pensamento. Não acrescentamos, fazendo-nos convivas; comunicamos e
sobre o primeiro movimento da comunicação erguemos toda a vontade de mais e
penetrante convivência” “(p.62).
(Obra citada: Luís do Espírito Santo, Estudos Comparativos: Henri Bergson – Leonardo Coimbra, Lisboa, Ésquilo, 1999.)
Luís
Tavares (18/12/2012)
Foto: Luís do Espírito Santo e Luís de Barreiros Tavares (1999-2000 +-).
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