L.B.T. : No
fundo percebo pouco destas coisas. Mas aí vai.
Parece
haver um curioso paralelismo, mas não identidade, entre o “princípio de não
contradição” (também chamado “de contradição”) em Aristóteles e o eon ou
to eon, forma participial com o sentido nominal ("o [nome] que
é") em Parménides. Porque, por um lado, afigura-se que aquele princípio dá
prioridade ao ‘que é’. Simplificando: “o que é (aqui: uma coisa) não pode ser e
não ser ao mesmo tempo e sob o mesmo aspecto” (Metafísica 1005b 19). Ou
então: “ não se pode afirmar e negar a mesma coisa de um mesmo sujeito, ao
mesmo tempo e sob o mesmo ponto de vista” (versões de R. Oliveira, in Enciclopédia
Logos, Verbo ed.; também consultei o meu Vocabulaire Technique et Critique
de la Philosophie de André Lalande). E, por outro lado, no eon, no to
eon em Parménides, talvez se possa dizer que já se lê, já se escuta um “ao
mesmo tempo” no “dizer e pensar que é seja; (…), enquanto nada não é” (fr.6).
Bem como na ‘mesmidade’ de “pensar e ser” (fr.3) e em “um que é,
que não é para não ser” (fr.2.3). Estou seguindo a sua última tradução.
A reiteração (termo usado por si algures, se bem me lembro) nestes e noutros
passos de Parménides (já tínhamos falado sobre isto) parece-me ser significativa
do sentido de ‘permanência’ e ‘mesmidade’ do to eon, implicando
eventualmente a questão do Tempo. “Mesmidade” em Heidegger (Selbigkeit),
“to auto, a palavra enigma do fr.3”, ou to auto “o próprio
enigma do pensamento de Parménides” (Heidegger, Vorträge und Aufsätze -
recolhi hoje estas notas de Heidegger do livro que estou a consultar de Marlène
Zarader, Heidegger e as Palavras da Origem, Inst. Piaget).
Não sei
até que ponto se poderá pensar a antepredicatividade no Eleata à luz da
mesmidade, nesta inscrevendo-se já, de algum modo, um “ao mesmo tempo”
anunciador do “ao mesmo tempo” ou “simultaneamente” enunciado no Estagirita.
Espero
que lhe interesse aqui alguma questão.
Isto
deu-me uma trabalheira.
09/06/2013
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J.T.S. : As suas
relações de Parménides com Aristóteles ficam fora da minha análise. Não sei o
que dizer-lhe.
Quanto
à “mesmidade”, é simples responder-lhe. Em B3 e B8.34, Parménides sustenta que
“pensar e ser são o mesmo”. É este o coração da antepredicatividade!
Ele não
afirma que são idênticos ou que estão relacionados, mas que são uma única e a
mesma entidade.
É claro
que esta ‘mesmidade’ não tem qualquer sentido num contexto predicativo, pois aí
são entendidos como uma “espécie de faculdade cognitiva” e o seu objecto.
Percebido
e aceite este ponto, a antepredicatividade torna-se compreensível.
09/06/2013
-
L.B.T. : Já vou
ler a sua resposta com mais atenção.
Mas
ocorreu-me já uma nota ao lê-la por alto. De facto, já me tinha indicado mais
do que uma vez que, quanto à antepredicatividade em Parménides, Aristóteles não
é para ali chamado.
Até
estive para lembrar na mensagem essas suas advertências argumentadas, que aceito.
Mas
isola a antepredicatividade em Parménides?
Por outro
lado, pode-se falar, por exemplo de antepredicatividade em Husserl, domínio que
confesso escapar-me em grande parte.
09/06/2013
-
J.T.S. : Não
isolo a ap em Parménides! Pelo contrário, o meu objectivo é estudá-la em
Platão.
Quanto
a Husserl remeto-o para o Pr. Pedro Alves e o seu recente estudo:
"Receptividade, juízo e verdade", publicado aqui, em Verdade e
Interpretação, Acylene C.- Ferreira (org.), Salvador 2012.
H.
estuda a ap numa perspectiva fenomenológica. Eu limito-me a tentar mostrar que
a ap é uma boa (senão a melhor) maneira de compreender alguns textos gregos
quase indecifráveis.
09/06/2013
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