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Caderno “Ensaio de
Ausência”
Secreto barco o céu
da boca
Que emite os sons,
os signos antigos,
As claves, o timbre
ausente,
Que habitam o manso
silêncio, diurno grito.
Extracto de um poema
Lx.13-3-75
A leve luz de Março,
navio de efémera fêmea,
Ilumina o ângulo
raso do olhar. E o tempo estreme,
De tão possuído, no
sangue, exausto, se consome e se perde.
Lx.3-3-74
(Exercício de riso)
Rir-me até morrer no
rosto da tarde,
Até romper os ritmos
traídos em ausentes vozes.
Rir-me do soalho
reticente do sol no olhar,
Da cama onde
principio a madrugada, da comida que não como.
Rir-me como lisa
sinalização de líricas ruas,
Movendo-me como
verme, nasalmente insone.
Rir-me de circulares
risos, da cirrose dos sorrisos.
Rir-me até, atento,
resvalar para o mapa do riso exemplar,
Até levantar vôo do
veludo vermelho do dia,
Até tripular o
opulento avião de ávida e árida pele.
Lx.8-10-69
Caderno “Limiar do
Desejo”
Como iluminar a
alegria
Da página
1984
Caderno “Da
Periferia ao Corpo”
Sob que ângulo
De perfeição
Sophia sofre
A erosão das
Navegações
Lx.30/1/84
-
Como se insinua o
passado,
O que foi.
Agora é uma metáfora
Quando passa
E pede silêncio.
Lx.1984
-
Caderno “Poemana”
(Frag.XV – Sapho)
-
“Devastador
O vento – e a
angústia”
Que queima deveras,
enquanto
A dor adoece sob o
vento
E as vozes dos
deuses recentes
São roucas
Lx.17-3-76
-
Página de rosto com citações de Oscar Wilde e Nietzsche
Detalhes da página de rosto
"É o espectador e não a vida que, na realidade, a arte reflecte."
"O Retrato de Dorian Gray"
"Prefácio"
Oscar Wilde
Citação de Nietzsche:
Um poema evocando Fernando Pessoa
Sem Pessoa, não era
pessoa:
Era a nostalgia de
ninguém…
Todo o poema que em
mim soa,
Ressoa a Pessoa.
E o gesto de
perfeição que me solicita,
Ou é a musa dos
antigos inscrita,
Ou é a presença
impessoal de Pessoa.
Que, na praia da
gente, mítica, repousa.
Lx.29-5-76
-
-
Abandonado ao marfim
do abandono
De mim-mesmo – que tatuagem!
Sem o teu mamilo,
que sorvo, que sou eu?
Mero som sonhado,
falo e não me ouço.
Há um jardim cuja suspensa
folhagem
Me acaricia, e há
gente, bulício, ternura, meu deus, uma rapariga rindo.
O poema existe, é
vertical dia, um rosto jovem, lindo.
Lx. 29-5-76
-
Dois poemas invocando e evocando D. Sebastião.
O palácio de Cintra*, outrora habitado,
Agora deserto.
Maravilhas dos Reis de Portugal.
Visito-o e comove-me
A longa solidão das salas do Paço.
Heráldicas antigas ouvem-me
E que Rei ausente habita agora o Paço.
Um grito agudo sacode as salas.
Intrigas, vetustas falas...
À noite, D. Sebastião surge com seu perfil perfeito, mas branco e baço.
*Noutra versão: "Sintra"
Lx. 30-5-76
-
Meu alto engano palaciano,
Com gládios vertentes,
Minhas armas, amores amargos...
Oh eu sonho a maresia
Do rescaldo de uma batalha...
Habitei as antigas salas de Cintra,
Ali minha presença despovoou-se.
A gente de Portugal não acredita
Em minha sorte, meu vão desterro.
Sou, agora, El-Rei; o Desejado,
Desembocando em uma manhã de nevoeiro
Deus elegeu-me para este meu novo destino.
Fui um príncipe solitário e sonhador em Cintra.
Ninguém, mas ninguém meu alto amor adivinha,
E minha loucura vos é estrangeira e vizinha...
Lx. 30-5-76
Estes e outros poemas deste caderno são assinados com "Manoel de Souza-Valente"
(Para a Isabel)
Quem meu desejo despia e acordava?
Quem meu coração aceso chamava?
Em o quarto, os lençóis de pólen de um dia,
Os despojos de quem, em o gelado lume, me nomeava...
Quem, no abstracto e quedo jardim do desejo, sabia, sábio, seus labirintos,
Imitava o suor do amor, e sues lábios infinitos e famintos?
Agora, em a memória acerba, meu Deus, a núbil praia dos teus beijos, quentes beijos, principia.
E sua memória se devora, queima. E eu lembro, Isabel, como se iniciava a nossa longa e gelada madrugada.
Lx.30-5-76
Desconheço se o autor opta pelo ponto de interrogação
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